segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

“Que mundo! Poderia ser maravilhoso se não fossem as pessoas.”


A ERA DO RÁDIO

Desde que começamos o blog, minha ideia inicial era comentar sobre algum filme do Woody Allen, mas, meu Deus, ele é um dos meus diretores preferidos, foi quase impossível decidir um dentre os (se eu não me engano) 41 filmes que ele dirigiu. Pensei em “O Dorminhoco”, mas eu já havia feito uma crítica sobre ele e ficou um lixo; não entrei num clima sério o suficiente para escrever sobre “Setembro”,  “Interiores” ou “Match Point”; Achei que “A Rosa Púrpura do Cairo” iria ser como se eu estivesse escrevendo sobre a minha própria fantasia (pela personagem da Mia Farrow) e também o ignorei; O Ivan deu a ideia de usar o vencedor de quatro óscares, “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa”, mas eu não conseguia começar nunca! Já estava desistindo de escrever sobre algum do Woody, quando, numa dessas noites tediosas de férias, assisti “A Era do Rádio”. E confesso que estou bem à vontade para comentar este filme, que é, sem dúvidas, um banquete para quem gosta desse velhinho viciado em trabalho!
Sei que existe um vício em achar que a maioria dos filmes do Woody Allen é ele-sobre-ele: homem de meia idade, morando na cidade de Nova Iorque, com relacionamentos conturbados, sendo um escritor/professor/psicólogo, hipocondríaco e cheio de neuroses. Acho mais fácil ver a mim ou a algumas pessoas do meu convívio num destes filmes estereotipados que ao próprio diretor. Agora, se alguém comentar comigo que achou “A Era do Rádio” uma reescrita da infância dele, eu definitivamente não vou poder contestar.
O que quero dizer é que quase me sinto íntima do tema, ouvi histórias sobre a tal era do rádio muitas e muitas vezes. Cresci com a minha avó contando sobre as novelas que ela ouvia todos os dias no rádio, sob a luz de lamparinas a querosene, com todos os filhos em volta enquanto ela tricotava alguma roupa nova; ou sobre os jogos de futebol que meu avô (e até mesmo meu pai) prestava atenção, desesperado, com o radinho a pilha grudado no ouvido. A comunicação de massa ocorria por meio do rádio naquela época, desde as notícias, os programas de auditório e as músicas, até o futebol do meu avô e as novelas da minha avó. Em “A Era do Rádio”, tudo é retratado de forma tão meticulosa que a gente sente que poderia passar mais umas boas horas na frente da TV sem se cansar, viajando mais um pouco pela magia e simplicidade dos anos que nossos avós viveram. Senti falta apenas do preto e branco para atiçar ainda mais a imaginação.
O filme retrata a vida de uma família norte-americana na década de 40, na qual vários parentes moram juntos na mesma casa, como ocorreu com Woody Allen em sua infância. O próprio diretor narra toda a história sem aparecer em momento algum. Digo que o filme é uma reescrita de sua infância por aspectos substanciais do enredo. Obviamente, muitas das histórias contadas são fictícias, como a da professora substituta que levou a imaginação dos garotos ao alto (apesar de ser real quanto ao inevitável “dia de folga” que acabava por acontecer quando surgia um substituto para uma matéria), a da saída com a tia e o namorado dela ou a do submarino alemão. Nas palavras do diretor: “Eu me apoiei em coisas da minha vida, mas é por isso que eu digo que não é autobiográfico. É muito mais exagerado, para melhorar a história.”.
Acho válido, também, deixar minha dica quanto a determinados episódios retratados: é muitíssimo interessante prestar atenção na cena em que o garoto Joe toma um táxi e, só então, descobre a profissão de seu pai, pois foi, também, mais um fato da infância de Woody Allen. Explica: “Esse episódio não é cem por cento verdade, mas quase. Cada vez que eu perguntava aos meus pais o que ele fazia, eles me davam uma resposta diferente, pois ele estava sempre mudando de emprego. Então eles sempre diziam: ‘Seu pai é um grande manda-chuva’, ‘O seu pai trabalha na cidade’, ‘Ele faz negócios’. Jamais consegui uma resposta direta.” – a diferença do que foi retratado no filme é que no dia em que tudo realmente aconteceu, Woody voltava do cinema.
Além desta cena, é impossível (e eu nem precisaria pedir atenção a esta parte) não se emocionar com a real história do resgate de uma garotinha que havia ficado presa no fundo de um poço. Tão tocante quanto todos os relatos sobre o ataque à base naval de Pearl Harbor pela MIJ, também acontecida naquela época (final de 41, sendo mais exata). Lembro que enquanto eu assistia, fiquei abismada com a forma como o diretor consegue fazer o espectador rir o tempo todo e, de uma hora para a outra e sem ao menos mudar o cenário, se emocionar.
Falei compulsivamente até agora, mas não comentei a parte que mais me encantou: falemos então da trilha sonora. E foi exatamente isso: me encantou, de fazer com que eu ficasse algumas horas ouvindo jazz e os grandes da Jovem Guarda. Em todos os seus filmes é presente a forte ligação de Woody Allen com a música clássica e o jazz. Suas trilhas sonoras são tiradas de seu acervo pessoal. Mas, de certa forma, eu só fiquei realmente tocada com isso após assistir “A Era do Rádio”. Falo especificamente da história da garota-dos-cigarros, Sally White (interpretada por Mia Farrow – na época, comprometida com o diretor), que tenta a todo custo trabalhar em um programa de rádio. Foram as censa que mais fizeram com que eu usasse minha imaginação desesperadoramente, em busca de um pouquinho do que aconteceu (de forma diferente, é claro) com a minha mãe na época em que ela cantava na rádio. São histórias que ela me conta sempre, nostálgica que só, iniciando com a frase “quando eu cantava na rádio...” e levando minha imaginação lá para a época dela, tentando imaginar uma Maringá em crescimento recebendo por ondas o seu vozeirão.
Com certeza por questões totalmente pessoais e familiares, coloquei “A Era do Rádio” na minha lista de filmes preferidos do Woody Allen. Talvez não encante a todos como aconteceu comigo, mas achei incrível de verdade a forma como minha imaginação foi longe enquanto a história acontecia. Sempre me identifico com algo ou alguém em seus filmes, creio que este foi o primeiro em que consegui ver a história no geral, sem prestar mais atenção em determinado personagem por me identificar com ele (apesar de, como contei, ter enxergado muito da minha família em tudo). E, por fim, achei engraçado o fato de eu sentir falta de algo que eu não vivi, após ver o filme. Sinto falta desses programas humorísticos, de auditório, de perguntas e respostas numa frequência. O que quero dizer é que toda vez que ligo o rádio – na maioria das vezes por falta de CD no carro –, o que escuto é tragédia ou essas músicas (ruins) que os adolescentes andam ouvindo.
Acredito que acabei deixando esta crítica totalmente pessoal, porém, acho muito difícil que alguém veja “A Era do Rádio” e não lembre das histórias que os antigos têm mania de contar repetidas vezes, em qualquer família, em qualquer lugar. O filme acaba sendo pessoal não só para mim (ou para o próprio Woody Allen, como uma parte da sua infância), mas de uma forma geral a todos da minha geração ou de anteriores – que escutam sobre os famosos Anos Dourados – e das que passaram por toda essa maravilha de se deixar guiar pela imaginação a partir de uma voz e da falta de imagens de um rádio.




Ana

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

“Eu sou tipo aquela vontade que dá, de repente, de tomar Fanta Uva.”

APENAS O FIM

Era começo de primavera quando meu melhor amigo me indicou um filme nacional que ele havia visto. Achei coerente combinar meu fim de inverno – externo e interno – com algo mais leve do que o que eu andava assistindo.
“Apenas o Fim” remeteu-me muito ao clima acadêmico no qual eu estou inserida há alguns anos. O filme é independente, foi feito com oito mil reais arrecadados a partir de uma rifa de whisky. Dirigido por Matheus Souza, estudante de cinema, e filmado em sua própria faculdade, a PUC do Rio de Janeiro, o longa mostra os últimos momentos na vida de um casal. Adriana (Érika Mader) decide fugir da rotina e dos problemas em que havia se metido e deseja passar seu último dia com o namorado, Antonio (Gregório Duvivier). Durante toda a trama, os dois relembram situações pelas quais passaram juntos ao longo dos quatro meses de namoro.
Na superfície, é uma comédia com diálogos até mesmo, às vezes, cansativos. Essencialmente, mexeu comigo de uma forma que eu nunca esperei para um início de primavera. Desde o que se sente estando numa universidade até detalhes (bons e ruins) de um relacionamento e da cabeça de uma garota de vinte e poucos anos. Em determinadas partes, a vontade de desaparecer impulsivamente, como Adriana resolveu fazer, bateu com força. Não falo de depressão-sem-motivo ou coisas do tipo, vejo na protagonista algo mais que apenas uma garota-descolada-usando-grandes-óculos-retrô. Talvez, além de uma vontade de ser diferente, enxergo nela todo o desespero que bate quando um jovem tenta associar estudo-trabalho-amor(es). E acaba que cada um encontra a solução em algum tipo de fuga (no caso de Adriana, no sentido literal).
Ao longo do passeio do casal pela faculdade, alguns flashbacks em preto e branco intervêm na tela. São episódios dos dois conversando sobre variados assuntos, deitados em uma cama. Lembro-me mais do diálogo que me fez soltar um sorriso – mais que entendendo, concordando: quando Antonio pergunta, “O que você acha mais importante: amor ou sexo?”, ao que Adriana responde prontamente: “A primeira opção! – pausa – Aliás, o que você falou primeiro?”. Mais que uma opinião, mais que um devaneio, mais que um estou-perdido-e-não-sei-diferenciar-um-do-outro, vejo tal assunto como um princípio.
Para não lamber o filme inteiro, digo que alguns problemas são claros, como a falta de experiência e até mesmo certo desânimo na atuação de Érika Mader. Mais, vejo cenas e atores secundários que poderiam ter sido cortados, deixando o filme mais limpo; certas tomadas mal colocadas que caso tivessem ficado de fora, teria havido menos possibilidades de cenas cansativas, que não andam nem desandam. Apesar disso, tudo pode ser perfeitamente entendido quando se parte do fato de que foi usado o que se tinha às mãos; e, vendo por este lado, toda a produção torna-se incrível, quase impressionante.
Tendo “Apenas o Fim” como o primeiro filme de sua carreira, acredito que pode-se esperar muito por vir deste jovem diretor. Talvez mais algumas – pequenas ou grandes – produções com ótimos diálogos, garotos que gostam de Star Wars e usam os óculos do avô, e garotas de All Star, óculos retrô e que choram com Under Control.
Um pedacinho de cada um está neste casal encantador, que faz com que a gente passe o filme todo torcendo para que Adriana mude de ideia, desde uma frase até uma semelhança na aparência. Por mais diferente que seja, acaba que todo mundo combina em alguma coisa. Woody Allen diria – realista, ainda que pessimista – que “a vida é uma situação de perdas e perdas”: todos sabendo que existe um prazo de validade para tudo e que quando chega ao fim, terá chegado a isto, apenas o fim, e não mudará o resto das próprias vidas.




P.S.: demorei a encontrar o filme em DVD para comprar, até que consegui pela loja online das Casas Bahia (já estando indisponível de novo). O outro lugar onde achei foi no Star Cine Shop, por um preço sensacional: http://tinyurl.com/2v4vy9t
Acho muito, muito, muito interessante apoiar o cinema independente, principalmente do nosso país e de um diretor tão jovem. Criar expectativas sobre o que é nosso é extremamente válido.


Ana

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Nosso bang-bang Tupiniquim

Bom, em primeiro lugar, sendo esta a minha primeira participação no blog, gostaria de mandar um abraço a todos os compõe o quadro de colunistas/blogueiros e dizer que é um prazer poder dividir esse espaço com vocês. Como não poderia deixar de ser, um abraço também a todos as leitoras e leitores. É um prazer ser lido por vocês.

Escolhi como primeiro assunto de abordagem a “guerra” contra o narcotráfico no Rio de Janeiro. As razões que me levaram a isso são simples: A importância evidente do tema e o “racha” de opiniões que ele tem provocado nos blogs sujos* da internet.

Tenho lido a respeito tanto nas revistas eletrônicas da mídia convencional (Folha de São Paulo e O Globo) quanto nos blogs sujos. O que mais me chamou a atenção é a divergência de opiniões a respeito da forma de ação da secretaria de segurança do Rio de Janeiro dentre os blogs sujos – que geralmente apresentam visões convergentes.

Uns sustentam, sem poupar elogios, que a ação da polícia fluminense foi um sucesso. Salientam principalmente a forma maciça e organizada com que foi organizado o cerco do complexo de favelas do Alemão, além de é claro elogiar a coragem dos atuais governantes de enfrentar o crime organizado carioca. Por outro lado, li diversos artigos que criticam de forma incisiva a abordagem inadequada feita pela equipe policial do Rio, que não respeita direitos básicos como inviolabilidade de domicílios, entre outros. Somado a isso, atacam as soluções “maniqueístas” utilizadas pelos atores políticos cariocas diante da proximidade de grandes eventos internacionais que o Rio e o Brasil sediarão.

A meu ver, ambas as visões são compreensíveis. Entretanto preciso dizer que a minha opinião a respeito do assunto é de que não existe – até onde os meus horizontes me permitem enxergar – outra saída a não ser o modelo aplicado pela polícia fluminense. Eu sou o primeiro a admitir que não é a melhor forma de abordagem, mas também sou o primeiro a admitir que não consigo propor uma outra. Haveriam inúmeras outras formas mais razoáveis e sutis de se intervir caso a situação não tivesse atingido tal gravidade. Os moradores do complexo do Alemão pagam o preço, portanto, duas vezes – uma pelo descaso, e a conseqüente situação com a qual nos deparamos, outra pela ação agressiva. A diferença, porém, é que o segundo pagamento, diferentemente do primeiro, pode vir acompanhado dos bens sonhados, a paz e uma vida mais digna. A garantia desses direitos – mais essenciais, porém não menos DIREITOS, que a inviolabilidade domiciliar – está ligada, a meu ver, a um trabalho firme de inclusão social** que vem sendo feito pelo governo Lula, e que Dilma promete continuar e ampliar, casada à ação coordenada das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) do governo do Rio de Janeiro. Essas políticas promoveriam um processo de revitalização das favelas, tornando-as bairros e não “cortiços”. Falando parece simples. Mas quem disse que a vida é fácil? Essas mudanças são graduais e complicadas, no entanto estão longe de serem impossíveis.

O governo atual mostrou que é possível construir um país mais justo, mais digno. Os desafios, tanto para o país quanto para o Rio de Janeiro, ainda são enormes. Mas quem disse que os cariocas, bem como todos os brasileiros, se acovardam diante deles?

Divergências a parte, tenho certeza de que todos os blogs sujos concordam que qualquer dos métodos de ação da polícia carioca serão de eficácia efêmera caso as políticas sociais e de segurança pública, que visam revitalizar as favelas, não sejam amplamente implantadas. Afinal de contas, o Brasil não acaba depois das Olimpíadas ou da Copa do Mundo. Mas talvez renasça, de uma vez por todas, um outro Brasil. O Brasil que queremos.


Felipe Vizzoto.


*Refiro-me aos blogs progressistas – como este – que tem conquistado cada vez mais seu espaço na mídia brasileira, contribuindo para uma discussão democrática no país. A denominação “sujos” foi conferida pela ilustre Verônica Serra, filha do candidato derrotado ao Palácio do Planalto, José Serra. O tiro saiu pela culatra. Se ser sujo é fazer jornalismo responsável, todos os blogueiros em questão tem muito orgulho de serem “sujos”. O apelido pegou.

**É bom que se registre que dentro do termo políticas sociais estão inclusos programas como: Luz para todos, Minha casa Minha vida, Bolsa Família, PROUNI, REUNI, entre outros. As políticas sociais não se resumem a programas de transferência de renda, mas também programas de habitação, saneamento básico e – mais importante – ampliação e melhoria (com inclusão) do sistema educacional brasileiro.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Boa música – 1

Não é exatamente da minha competência escrever sobre música, mas não resisti comentar a recente explosão da banda Nevilton, de Umuarama, Paraná, ou de Paraíso do Norte, também Paraná, há discordâncias sobre a verdadeira naturalidade deles.
Recentemente, a banda do interior paranaense vem ocupando seu espaço no cenário nacional, o que, diga-se de passagem, é bem merecido. A banda tem um algo a mais, pois por onde passa deixa sua marca e conquista alguns fãns.
Formada por Tiago Lobão, Nevilton de Alencar e Chapolla, três caboclos que, além de excelentes músicos, se entendem estupidamente bem no palco. O Nevilton faz o chamado ROCK PRESIDENCIAL, termo, pelo que me consta, inventado por eles mesmos com relação às antigas festas organizadas ainda em Umuarama, antes de se naturalizarem Norte-paraisenses, regadas a muito conhaque.
Em Paraíso do Norte, a banda Nevilton apareceu para tocar pela primeira vez em 2008, em um festival tradicional da cidade, o Paraíso do Rock. A partir daí, passou a voltar frequentemente, justamente porque a cidade não deixou de ouvir e comentar sobre suas músicas.
Engraçado que numa cidade historicamente com forte influência da música sertaneja, ao se mencionar a banda Nevilton a recepção ocorre com a mesma aprovação que teria caso tivesse mencionando o nome de qualquer dupla sertaneja famosa.
Nevilton conquistou Paraíso e agora está prestes a conquistar o Brasil.

Sorte, moçada!

Confira um pedaço do show da banda:




Ivan.

sábado, 20 de novembro de 2010

Entrando na montanha russa...

Prefácio:
Escrever sobre música ou sobre qualquer outro assunto não é uma tarefa fácil. Descrever algo que aconteceu às vezes se torna perigoso, pelo fato de que devemos ser justos com aquilo que iremos relatar, não alterando o que, de fato, ocorreu e tentando dar nossos pontos de vista sobre fatos que aconteceram sem que criemos uma única opinião. Isso tudo visando que o leitor, acima de tudo, tenha sua própria visão. Então deixo a vocês, leitores, total abertura para que possam criticar/corrigir/comentar, sintam-se livres...
Espero que se divirtam com o que irão ler e que possamos trocar idéias sobre assuntos diversos.

Uma breve viagem antes da estrada principal
Ao pensar sobre qual primeiro assunto musical escrever, ocorreu-me diversos temas. Pensei em escrever sobre a música cronologicamente, pensei em escrever sobre os diversos estilos existentes reunidos em blocos e, por fim, nenhum deles tinha uma força que me impulsionasse. Então pensei que, para este primeiro momento, deveria escrever sobre um marco importante, sobre algo inovador e ao mesmo tempo influente. O que me veio à cabeça foi o ano de 1967: para muitos, o ano em que a música finalmente foi elevada à categoria de arte; e para outros tantos ou para maioria, o ano da psicodelia.
Mas antes de entrarmos certeiramente nesse ano, façamos uma retrospectiva ao que aconteceu anteriormente, para que possamos entender o célebre 67.

Beat Generation, da esquerda para a direita William Burroughs, Allen Ginsberg, Jack Kerouac.


Todo o panorama contracultural da época em questão era influenciado pelos escritores beatniks da década de 50 e 60, que tinham como elementos centrais a experimentação com drogas, alternativas formas de sexualidade, um interesse pela cultura oriental e a rejeição do materialismo. Tendo Jack Kerouac, William S. Burroughs e Allen Ginsberg como a santíssima trindade do movimento. Influenciados também pelos promovedores da expansão da consciência, nos quais estavam incluídos Timothy Leary e Aldous Huxley – com este último descrevendo suas experiências com a mescalina no livro The Doors of Perception (1954).
Dez anos depois, o psicólogo/professor de Harvard, Tim Leary, descrevia os beneficios do uso do LSD (Lysergsäurediethylamid, palavra alemã para a dietilamida do ácido lisérgico) em seu livro The Psychedelic Experience: A Manual Based on the Tibetan Book of the Dead (1964), sendo este expulso de Harvard por fazer uma experimentação da droga com uma turma de alunos.
Se no final da década de 60 essa droga já era proibida, um pouco antes disso ela era totalmente liberada, tendo inclusive pesquisas patrocinada pela CIA nas universidades do país.

  
Esquerda para a direita, Timothy Leary e Aldous Huxley

"... a música é afetada pelas substâncias das quais você abusa." - (Dennis Thompson - ex-MC5)

Na música, a experimentação não poderia ser diferente. Se antes os Beatles faziam um som mais “bobinho”, presente na fase iê-iê-iê, depois de eles serem apresentados por Bob Dylan à famosa Cannabis Sativa, em 1964, ficaram ainda mais experimentais. As letras apresentavam-se mais sofisticadas e com conteúdo melhor trabalhado, e, como não podia ser diferente, dentro do estúdio os rapazes começaram a inovar, o que se pode observar já no belíssimo álbum Rubber Soul (1965), no qual se pode notar o uso da cítara (graças a George Harrison), entre outros efeitos sonoros, também sendo influenciados por artistas contemporâneos de folk rock como os Byrds e Bob Dylan, que respectivamente lançariam Fifth Dimension e Blonde on Blonde em ’66.
Não que toda essa evolução fosse graças somente à maconha, também evoluíam como compositores e músicos, graças às turnês promovidas e ao tempo passado no estúdio.  Lembrando que em ’65, George e John teriam tido uma primeira experiência com o LSD, o que eles abordariam sem papas na língua no álbum seguinte, apesar de já terem dado a dica com Day Tripper, single lançando no mesmo ano de Rubber Soul.
E como era de se esperar, os Rolling Stones também sacariam todo esse barato experimental e viajante. Não se pode negar que os Beatles e os Stones eram bandas que se inspiravam uma na outra. Logo no começo de 1966, lançavam Aftermath, disco este que mostra os Stones mais centrados em composições da dupla Richards/Jagger, e com o genial Brian Jones experimentando uma variedade de instrumentos não convencionais para o Rock, o que lhe dava uma base pra lá de rica para o que ele iria aprontar mais pra frente. Legal também é sacar a letra de Mother's little helper, o qual os Stones alfinetavam a hipocrisia do discurso antidrogas, feito por uma sociedade que abusava de tranqüilizantes para enfrentar uma vida "sem sentido" e estressante; para agüentar as crianças de hoje, nada como o ajudante da mamãe.
O ano de 1966 (o grito primal do que viria a ser ’67) começava cheio de experimentações com os californianos dos Beach Boys lançando Pet Sounds, sendo um flerte da ainda não titulada psicodelia com a música pop, com Brian Wilson tendo sido influenciado pela sua experimentação com o ácido e pelo já citado Rubber Soul. Bandas como The Doors, Cream também foram de extrema importância para o desenvolvimento do gênero, vide canções como I Feel Free (Cream), Eight Miles High (Byrds), Good vibrations (Beach Boys) e Rainy Day Women #12 & 35 com Dylan cantando aos quatros cantos do mundo que “Everybody must get stoned!” (Todo mundo deve ficar chapado), música esta que foi banida de muitas rádios americanas e da BBC devido à paranóia antidrogas reinante na época. Se Dylan, nesta época, já havia eletrificado seu som e não se considerava mais um cantor folk, Donovan um cantor folk britanico apresentava uma junção da musica psicodélica com a música folk, junção esta que recebe o nome de Acid Folk, em seu disco Sunshine Superman.


Neste mesmo ano foram lançados dois discos importantes para o desenvolvimento do movimento psicodélico e do que viria ser a efervescência de 1967. 

"Estamos todos interessados em muitas coisas que antes não nos haviam chamado a atenção. Eu tenho milhões de idéias novas". Paul McCartney

Exatamente no dia 5 de Agosto de 1966 saía, pela Parlophone, o sétimo álbum da banda britânica Beatles, intitulado Revolver. Com uma arte pra lá de bem feita pelo artista e baixista Klaus Voorman, e com um conteúdo ainda mais interessante, recheado por guitarras bem trabalhadas, cítaras e efeitos. Tal disco apresentava três composições de um tímido, porém talentoso, Harrison, com este mostrando toda sua evolução no estudo da cítara, além de ter ido à Índia em encontro a Ravi Shankar e à toda cultura espiritual oriental.

1. Taxman (Harrison)
2. Eleanor Rigby (Lennon/McCartney)
3. I’m only Sleeping (Lennon/McCartney)
4. Love you too (Harrison)
5. Here, There and Everywhere (Lennon/McCartney)
6. Yellow Submarine (Lennon/McCartney)
7. She Said She Said (Lennon/McCartney)
8. Good Day Sunshine (Lennon/McCartney)
9. And your bird can sing (Lennon/McCartney)
10. For no one (Lennon/McCartney)
11. Doctor Robert (Lennon/McCartney)
12. I want to tell you (Harrison)
13. Got to get you into my life (Lennon/McCartney)
14.  Tomorrow never knows (Lennon/McCartney)

Os destaques do disco ficam por conta de Taxman, dilacerando uma guitarra marcando o tempo e uma linha de baixo muito bem trabalhada; da balada Eleanor Rigby, com os arranjos de corda do mestre George Martin; e de I’m only sleeping, na qual Lennon, como uma voz meio viajante, dita um quase hino à preguiça. Nesta faixa também apresenta uma das grandes sacadas nos efeitos de estúdio, com guitarras tocadas de trás para frente.
O disco passa por grandes momentos, como Love you too, com Harrison mostrando toda sua técnica na cítara e sendo acompanhado pela tabla, instrumentos indianos; passando pela clássica Yellow submarine, eternizada na voz de Ringo Starr; She Said She Said saiu quando os Beatles estavam na companhia do ator Peter Fonda e todos, com exceção de Paul, estavam em uma viagem de LSD e um comentário de Fonda inspirou John a escrever a música.
Por fim, a faixa Tomorrow Never Knows (trocadilho de Ringo que Lennon resolveu usar para tirar um pouco do tema pesado e filosófico da canção, que é totalmente influenciada pelos ensinamentos de Tim Leary presentes em seu já citado livro “Experiência Psicodélica”) é uma das canções mais inovadoras e psicodélicas dos quatro rapazes; chega a ser quase hipnótica a voz de Lennon passando por uma caixa Leslie (da qual falaremos mais adiante) para que esta tivesse o efeito de um monge recitando mantras no alto de um monte, pelo menos essa era a intenção de John – e, convenhamos, belíssima intenção.

Produtor: George Martin
Engenheiro de Som: Geoff Emerick
Paul McCartney - Baixo, guitarra, efeitos sonoros, vocais 
John Lennon - Guitarra, órgão, marimba, efeitos sonoros, pandeiros, vocais 
George Harrison - Guitarra, baixo, sitar, efeitos sonoros, pandeiros, vocais
Ringo Starr - Bateria, pandeiros, vocais




Lembrando que a intenção aqui não é fazer apologia a nenhuma droga, usá-las é uma decisão sua e não de outros.


Na próxima parte dessa postagem falaremos do segundo disco importante para 1966 e, finalmente, entraremos no universo lisérgico de 1967.

Pra você que se amarra em vinil, CDs e camisetas de diversas bandas, inclusive das que você leu aqui, entre em contato com a loja do meu querido amigo Eduardo e se deleite no universo musical deste. Grande abraço a todos.



Vitor

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Réquiem Para Um Sonho


Sou muito indecisa, admito que levei um bom tempo até decidir sobre qual filme eu escreveria para iniciar minha seção no blog. Eu tinha 16 anos quando assisti pela primeira vez a um filme que me fez chorar... minutos soluçando ao som da música que trazia os créditos finais à tela.
"Réquiem Para Um Sonho" me fascinou à primeira vista, naqueles 16 inocentes anos, mesmo com as milhares de dúvidas que rodearam minha mente ao fim do filme. Hoje, quatro anos depois, acho genial a forma como ainda enxergo algo novo a cada vez que volto a vê-lo.
Lembro que “Réquiem” me foi indicado como “um ótimo filme sobre drogas”. Hoje, eu o recomendaria sem medo como um incrível longa sobre vícios. Há uma fragilidade muito grande na história de cada personagem retratado. Sara Goldfard (Ellen Burstyn) é uma mãe viciada em televisão, comida, emagrecimento e, consequentemente, anfetaminas; tudo para alimentar o sonho de aparecer em seu programa preferido, usando o vestido vermelho e os sapatos dourados que usara na formatura de seu filho, Harry Goldfarb (Jared Leto): viciado em heroína e demais drogas ­– lícitas e ilícitas –, que divide tais vícios com seu amigo, Tyrone (Marlon Wayans), e sua namorada, Marion (Jennifer Connelly).
E durante toda a trama, vê-se diferentes formas de compulsão por variados objetos: o rico viciado em mulher (ou pussy, como é dito no filme), o psicólogo viciado na paciente, os telespectadores viciados no programa de perguntas e respostas, os enfermeiros viciados em jogatina... O que ocorre é uma forma de mostrar que toda a discriminalização que existe por adictos, que essa mania de torcer o nariz e dizer “Ele está perdido, não passa de um drogado.”, é isso e somente isso: uma mania, um vício a mais. No final, somos todos viciados em algo, de alguma forma.
“Réquiem Para Um Sonho” é, do começo ao fim (especialmente no fim), um drama que mostra que para determinados desafios, só nascendo de novo; e a cada cena, toca-se o réquiem* dos sonhos de cada personagem.
Em 2006, o longa de Darren Aronofsky me foi recomendado como um filme pesado, que “não é para qualquer um”. Concordo, mas digo que é tão pesado quanto a nossa realidade e, talvez por isso, de fato: não é para qualquer um.

*marcha fúnebre

Trailer: 


Ana

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Política Brasileira - 1

A Raiva da velha elite

   Os históricos 'donos' do Brasil hoje sentem-se inseguros. E eu não estou falando dos trabalhadores do dia-a-dia, que dão duro, mas sim, daquela velha elite, a mesma que quis vender o Brasil e hoje veste roupa de cordeiro.
    Se o Brasil tivesse um gráfico geral, seria de ascenção. O crescimento econômico em função do aumento do crédito, do aumento do investimento no setor produtivo e do consumo interno seria uma ponta, e a queda crescente da miséria e da pobreza seria a outra.
    Por outro lado, ainda temos um país onde a educação continua precária. A educação pública - ensino fundamental e médio - do Brasil não oferece futuro seguro nem perspectiva alguma. Os gradativos investimentos são apenas paliativos, que a curto-prazo são importantes, porém, e quanto ao longo?
    Esses paliativos, os quais ainda achamos insuficientes, para a velha elite já são a gota d'água. Quando os grandes fazendeiros e investidores do capital improdutivo imaginariam que seus filhos, criados nas melhores escolas estrangeiras, iriam dividir salas numa universidade pública, ou até mesmo privada, com os filhos do pedreiro que construiu sua mansão e o cortador de cana que produz sua riqueza?
    O que consideramos paliativos são considerados por estes como esmola, caridade, preconceito - como é o caso das cotas - e desperdício de verba pública.
    Mas o que realmente a velha elite gostaria para o Brasil? Não me leve a mal, caro leitor, mas essa velha elite não quer mais do que ter de volta seus bons e aconchegantes privilégios de antes.

Ivan Prizon